A Associação de Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos de Valinhos (AEAAV), durante todo o processo de revisão das Leis do Plano Diretor e Uso e Ocupação do Solo, participou ativamente das discussões, debates, apresentou propostas, se posicionou quanto as propostas em discussão e em sua aprovação final, e se colocou à disposição para esclarecimentos a sociedade, grupos organizados, entidades, no que compete como entidade técnica do município.

Não poderíamos nesse momento deixar de fazer um BREVE COMENTÁRIO SOBRE A LIMINAR PARA SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DAS LEIS MUNICIPAIS Nº 6.573/23 E Nº 6.574/23, RESPECTIVAMENTE LEI DO PLANO DIRETOR E DA LEI DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DO MUNICÍPIO DE VALINHOS – Direta de Inconstitucionalidade nº 2142594-32.2025.8.26.0000

A Liminar impetrada pelo TJSP em 21 de maio de 2025, relativa à ADI nº 2142594-32.2025.8.26.0000 é uma “luz no fim do túnel” para redimir Valinhos e, em especial, a sociedade civil organizada representada por inúmeras entidades consolidadas, grupos de moradores e cidadãos comprometidos em geral, que, desde meados da primeira década dos anos 2000 se empenharam em tentar construir junto aos Executivo e Legislativo Municipais um FUTURO COMUM A TODOS de boa qualidade, por meio de um processo digno e EFETIVO de participação, projeto esse que desembocou no descaminho da aprovação das Leis Nº 6.573/23 E Nº 6.574/23, respectivamente Plano Diretor e Uso e Ocupação do Solo.

À parte a atualização necessária e óbvia de referências às legislações Federal e Estadual correlatas na revisão das duas Leis, igualmente a produção de cartografia de base recente e a tentativa de contextualização das Políticas Públicas ajustada ao período decorrido, desde as primeiras iniciativas do Executivo em 2013, já tardias, o resultado objetivo obtido com as duas Leis explicita a tônica da condução do processo pelas instâncias competentes: liberação imediata de frentes de urbanização intensiva para ocupação máxima do território, entendido como ativo prioritário do município a ser operado na gestão, seja pelo parcelamento de áreas aparentemente “disponíveis e vazias” – entenda-se, áreas rurais e de preservação, seja pela intensificação da densidade construtiva pela verticalização de áreas de morfologia horizontal residenciais e comerciais locais, seja pelo avanço de usos de natureza incômoda de média e alta gravidade sobre áreas residenciais e rurais, entre outras.

Desse caráter, decorreram as duas Leis que, EFETIVAMENTE viabilizaram, tão somente e em ato contínuo à aprovação, toda e qualquer ação de aproveitamento das novas regras de implementação de empreendimentos relacionados ao uso e à ocupação do território municipal, com amplo espectro de decisão delegado aos agentes privados para transformação da realidade local, sendo as consequências disso relegadas a planos setoriais futuros sem garantias de sua execução e operacionalização, embora com prazo pré-definido no texto. Em suma, o futuro atribuído ao acaso, à sorte, ao curso fortuito das possibilidades de remediação à custa da vida de toda a comunidade.

Não à toa a Liminar se baseia em análises documentais que apontam a ausência de planejamento técnico precedente relacionadas à extensão injustificada de frentes de urbanização incerta pelas denominadas Macrozonas de Desenvolvimento Orientado – MDO´s (sic!) que se implantam nas franjas desconexas do perímetro urbano já determinado, em áreas de infraestrutura incipiente e com alto poder de comprometimento a atividades rurais produtivas e a zonas residenciais existentes.

Tampouco se considerou o grau de ociosidade de lotes vazios e subutilizados no tecido urbano já consolidado, da ordem de milhares, e em zonas de uso industrial, inclusive ao longo dos principais eixos de transporte, caracterizando um evidente estímulo à atividade especulativa, seja no parcelamento do solo em áreas descoladas da infraestrutura existente, seja em verdadeira reserva de mercado do território municipal – exemplo das Zonas de Desenvolvimento – ZDE´s 1,5 e 2,5 na borda SO, região do Capivari.

Neste mister, cabe ressaltar o embasamento da Liminar no questionamento quanto à violação do princípio da impessoalidade, dado que a delimitação das referidas áreas de expansão urbana desmedidas tangencia ou se sobrepõe a glebas e empreendimentos específicos, apontando para a valorização de áreas de poucos proprietários, em detrimento a ônus econômicos e perdas ambientais que certamente recairão sobre a comunidade como um todo.

Não à toa, igualmente, a Liminar se remete ao princípio da violação da vedação ao retrocesso ambiental, pois ao lado das consequências já mencionadas de danos urbanos, ambientais, sociais e patrimoniais às comunidades pré-existentes nas áreas de expansão urbana desmedida, essas se sobrepõem majoritariamente sobre zonas de cabeceiras de bacias hidrográficas do município, várias dessas de importância para a reserva hídrica futura, local e regionalmente, em uma região que se encontra já há décadas em evidente regime de estresse hídrico e de disputa pela água.

Por fim, a Liminar aporta questionamento sobre a efetiva participação da coletividade no processo de revisão, que se entende, não apenas pela agenda de reuniões e audiências públicas, mas também e, principalmente, pela observância dos pleitos justificados da sociedade civil organizada, que durante anos se manteve ativa e atuante, produzindo análises, documentos e conhecimento estruturado sobre a realidade do município e se pautou pela defesa de uma gestão responsável e comprometida com a melhoria do presente, o respeito ao passado e a garantia de um futuro bom para todos, mas que, não se viu refletida nas duas Leis aprovadas, e que agora são questionadas, com pertinência pelo TJSP.

No sentido de esclarecer a comunidade sobre o real efeito das Leis propostas, grande parte do trabalho da sociedade civil organizada se constituiu na produção de estudos, material de visualização das propostas e explicação acessível dos textos técnicos, como se poderá ver em exemplo abaixo sobre o efetivo resultado da implementação do Zoneamento proposto (Revisão 08, 2023, trâmite no Legislativo), com a adição das informações do Macrozoneamento e sobreposição com os limites das bacias hidrográficas, significando síntese não contida nos textos oficiais e, em geral, de difícil percepção pela comunidade dos impactos que poderiam advir, e cujos efeitos deletérios se intentou sempre evitar.

Figura 1 – Mapa de Zoneamento, Rev. 08. Fonte: SDUMA/PMV, 2023.

Figura 2 – Mapa do Zoneamento resultante traduzido com o acréscimo da expansão urbana das MDO´s e impacto sobre as bacias hidrográficas. Adaptação sobre original SDUMA/PMV, feito por LEITE, M. A. D. F. A e SILVA, R. S. S, 2023.

 

Valinhos, 28 de maio de 2025

Eng. Helio Bortoletto Jr. (Vice-Presidente AEAAV; GT Revisão Plano Diretor e LUOS/ AEAAV) e Dra. Arq. Maria Amélia Devitte Ferreira D´Azevedo Leite (GT Revisão Plano Diretor e LUOS/ AEAAV)